CARNE DE PESCOÇO

26 junho 2006

“Insight Floydiasepínico 2”

“Média-ocridade”

Quem tem mais valor: o velhinho da rua XV, o papa, um assassino, o Pedro ‘Lôco’, Salomão, Drácula, ‘Teveginha’, Hitler ou um soldado solitário?
Todos já quiseram um dia ser bombeiro, monge, macaco, mosqueteiro e astronauta. Hoje, apenas somos, e as vezes tentamos não ser...
Atualmente, como não existe nada de novo, as águas parecem pedras. Existe um vazio, um momento caótico no que se refere a qualquer esfera de movimento das ‘coisas do homem’.
A busca de desejos, vitrines, matéria ou espírito são desvarios antagônicos de valores absolutos.
V-A-L-O-R, esta palavra tem poder!!!
Esta palavrinha faz com que eu seja completamente diferente de você. Por exemplo: dou nota dez à minha coleção de discos de vinil e nota zero ao seu diamante que serve somente para ficar pendurado no seu pescoço. Então, quem é escravo, eu ou você... quem é louco, eu ou você...?
A lama deste escravagismo já nos cobre a cabeça e a loucura não é aquela que está escrita nos dicionários.
Essa arapuca nos foi armada durante séculos e nela vivemos, presos e conformados, engolindo o alpiste que nos dão.
Entoemos então o “Abra que eu quero voar...!”

‘Asas’ pássaros Cativos!

Ou seremos eternos pássaros tristes presos nesta arapuca com alpiste racionado.

‘Asas’ Pássaros Cativos!

Porque às árvores nós pertencemos!!!

Jóca Barrett

21 junho 2006

Anônimos





Quando dei por mim estava quieto num canto, pensando se acendia um charuto ou não, já que nesses textos quase todos fumam. E quando se fuma acontece alguma coisa. Resolvi não acender, mas o vinho eu abri, são raras as vezes que abro vinho pra tomar sozinho. E foi depois do terceiro copo que pensei com meus botões. Há uma inconfidência em Mafra, é verdade, inconfidência mafrense.
Há uma série de especulações tratada através de textos, sussurros, olhares e frases quase insanas de sujeitos com no mínimo dois pseudônimos a mais que o permitido. Descobri isso nos conflituosos scraps destes nossos amigos bloqueiros. Descobri que esses seres estão criando um mundo paralelo. Ainda não há um objetivo definido, mas há uma expectativa, como um corvo que fareja a sua próxima refeição.
E todo mundo sabe que sempre foi assim. A história foi feita por anônimos. Não eram os reis e príncipes que faziam a diferença e sim os anônimos que são os autores das mais estranhas façanhas. Organizam a mudança em suas idéias e as emprestam para outros para que as executem e levem a fama e claro que isso tudo sem ninguém saber. Pois são anônimos.
Os anônimos são poderosos, seus textos são gritos, suas falas são cochichadas, suas discussões de bares que parecem conversas despretensiosas são suas facadas em ventres desprotegidos.
Isso tudo eu penso porque fui vítima de um anônimo sagaz, que me conhece e sabe das minhas fraquezas, dentre elas a dificuldade de vociferar em textos de baixo escalão. Deve ser a estrutura de meu ego narcizista abalada. E o anônimo, que finge ser ignorante, acerta golpes no tendão aquileu. E assim faz o blog girar.
Mas tchan! Em um sonho me foi revelado, foi catártico. Levantei o véu da face anônima. Na primeira oportunidade lancei duas ou três indiretas, um olhar inclinado e pronto, foi suficiente pra ele deixar claro que ele era ele mesmo. Ah! é assim? E o mundo normal esticou seu indicador quase tocando o mundo paralelo.
È claro que não me aborreço com isso. Pelo contrário, me rendeu grandes gargalhadas. E vou ficar quieto no meu canto, com meu sorriso que contrai somente dois músculos, feliz por descobrir um anônimo que faz a história
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11 junho 2006

Ei você!

Ei você!

Eestava no meu domingo tranqüilo, tentando pensar em todo o que estava se passando por esses hard days night... e estava olhando o sol se por com aquele vento melancólico... e estava pensando em coisas gentis que acontecem mesmo pra aqueles que tem uma vida de carne de pescoço... e estava lá, tranqüilo quando lembrei-me de você.
Lembrei-me que não te disse nada naquele bar, ou melhor, te disse somente coisas agradáveis, pois já faz tempo que aprendi a ser falso. E como diz um amigo, mentira é quase sempre a coisa mais certa a se fazer. Veio uma azia por traz de minha garganta e subiu até minha nuca. Acabou minha tranqüilidade. Pensei em algo pra te dizer.



Então seus sentimentos foram remexidos e sentiu um forte cheiro de mofo, um café requentado, uma água enferrujada e é isso que você quer nos dar? Se ao menos você soubesse falar, mas suas palavras estão escondidas, atrás de uma cortina suja, de um cesto de roupa molhada, suas palavras sumiram.
Não pense que vai nos enganar com essas idéias que não são suas, com essas frases que lê em orelhas de livros, onde você está? O que você é? Hã? Pare de se defender com seu humor barato, é isso que chama de criatividade? Onde está sua força ?
Você é um fraco!
Que quer que eu lhe diga? Que lhe acalme e bata nos ombros? Continue?Mas pra onde?
Não se engane você não passa de um ex qualquer coisa, que quase foi um dia, enquanto bebia... E nos fez pensar que era, mas não, não era nada, era um vento, ilusão.
Então desista e repare bem que está nessa caverna, nessa sala com as paredes urinadas, nesse lodo.

Seu amigo Zaratustra.

09 junho 2006

- Mato aquela cadela, mato! Repetia para si mesmo com os dentes cerrados esmagando o filtro de um cigarro barato que havia acabado de se apagar com achuva torrencial que começava. Arrumou o chapéu para a água escorrer para frente, chapéu que já devia ter tomado muita chuva na cabeça de seu avô que trabalhava, faça chuva ou faça sol, na construção de estradas de ferro no velho continente. Abrigou-se sob um toldo de uma "brasserie" cerca de duas quadras do prédio dela. Estava resignado, porém aflito. Suas mão trêmulas tiveram dificuldade para pegar outro cigarro, sentiu no bolso fundo da calça sua pistola, fria e dura. Não achou os fósforos. Pediu a uma jovem que passava na calçada, sem medo da chuva, mas com pressa, se teria um isqueiro ou algo do gênero. A menina parou, abrigou-se também no toldo, abriu sua mochila e procurou fogo em meio a uma dezena de canetas, cadernos e livros. Aparentava dezessete anos, cabelos curtos e rebeldes, moldados a gel, tatuagem clássica de borboleta no lado direito das costas escrito em baixo "papillon bleu". Ofereceu-lhe um isqueiro e um cigarro, marca cara. Ele aceitou sem esboçar sorriso. Ela acendeu um também, desligou seu Ipod, retirou os minúsculos fones do ouvido, e fumou lentamente, soltando longas baforadas cinzas, da cor do céu, no ar límpido dum dia de chuva. Ele fumava ansioso, tremia o cigarro na boca. Tinha medo que ela lhe fizesse perguntas, não queria falar com ninguém, a unica coisa que queria era matar aquela cadela, sua ex-amante. Ela fez um comentário banal, Choveu de repente, né? Ele assentiu com a cabeça, olhando-a muito rapidamente, manteve a cabeça baixa. Quando acabou seu cigarro ela disse, Vai ser um final-de-semana chuvoso e feio, mas de qualquer forma é um final-de-semana, temos que aproveitar, né? Ele levantou a cabeça, mirou seus olhos nos dela, verdes como o mar, e sorriu discretamente. Difícil saber se ele tinha uma lágrima ou a água da chuva escorrendo pelo lado de seu nariz e parando na barba por fazer do queixo. Ela continuou seu caminho pela chuva. Ele gritou, Tem horas? Ela abriu um grande sorriso, virou para ele, abriu os braços debaixo da forte chuva e gritou, São seis horas de sexta-feira, a melhor hora do mundo.
- Mato aquela cadela, mato! Agora chorava, copiosamente. Era a pior hora do mundo. Olhou para a janela do terceiro andar do prédio da ex-amante. Cortinas ainda fechadas. Engoliu o choro, terminou o cigarro, sentiu mais uma vez a pistola em seu bolso. Era poderoso, tinha a vida de vários ao seu redor em sua mão. Nunca tinha pegado numa arma, raras por aqui, mas podia sentir o poder daquela máquina, o favor que ela ia lhe fazer, matar aquela cadela. Pouco importava o risco que correu para ter uma pistola ou os danos colaterais que ela poderia trazer, isso veria depois. Ia fazer um favor para a humanidade, ia matar aquela cadela. Um amigo havia lhe dito, Para com isso, rancor é como um veneno que você toma e fica esperando a outra pessoa morrer, coisa pouco inteligente. Concordava com a visão do amigo, mas dessa vez era diferente, ele tomou o veneno, mas ela vai morrer.
Nunca tinha pensando no futuro, jovem com cerca de trinta e cinco anos, solteiro, família pequena e longe. Agora que não tinha mais futuro se deu conta de como isso lhe faria falta. Os filósofos compreendem cedo a finitude do ser humano, o fim da vida e a velhice inquietam a todos. Porém ele, que nunca apresentara uma inquietude existencial, se via agora sem futuro. Não conseguia parar de pensar que tinha um virús que lhe comia os glóbulos brancos e que terminaria por comê-lo todo em pouco tempo. Que morreria sofrendo, que nunca veria os filhos que não vai ter, que nunca mais gozaria os pequenos prazeres da vida e, principalmente, seria precocemente esquecido num cemitério por toda a eternidade. Seus médicos chamavam isso de estresse pós-traumático, ele chamava de ódio. E seu ódio tinha um culpado, era ela, cadela, que tinha lhe passado essa doença maldita, que tinha lhe tatuado a vergonha na testa, que tinha lhe roubado toda uma vida. Quantos mais ela matou? Mas isso vai acabaar, hoje mesmo eu mato essa cadela!
A cortina foi aberta na janela do terceiro andar, uma luz se acendeu. Ele suava, suas mãos tremiam, tinha a boca seca e as pernas bambas, mas estava convicto. Iria curar seu ódio e seu rancor, ia parar com mais sofrimento, ia morrer um pouco menos pior. Não a via há um ano e meio. Iria sorrir depois de lhe meter uma bala no meio dos olhos, talvez até conseguisse se divertir mais tarde nessa sexta-feira chuvosa. Caminhou rápido pela chuva, se parasse cairia sem controle nas pernas. Entrou no prédio e subiu até o terceiro andar. Apartamento 32, não poderia contar quantas vezes havia entrado naquele lugar repleto de felicidade, por vezes com ela no colo. Ela tinha cabelos escuros, filha de espanhois, grandes bochechas rosadas e um enorme sorriso. Pernas grossas e ágeis, seios fartos, voz doce. Com ela ele tinha sido um dos homens mais felizes do planeta. Com ela tudo era bom, os problemas da vida eram menores, um pequeno sorriso constante na boca. Mas o diabo se dissimula e aquela cadela tinha lhe dado uma sentença de morte nas noites de amor.
Abriu a porta lentamente, ainda tinha a chave, percebeu o corredor escuro. Havia luz na cozinha, mas ela não estava lá. Cheiro de azedo, comida estragada, louça suja na pia, sujeira no chão. A luz azulada da televisão iluminava a sala. O mesmo sofá de outrora. Tentou acender a luz, mas não funcionava, agora o cheiro era de mofo. Empunhou a pistola, destravou e engatilhou como lhe ensinaram, estava pronto, o dia tinha chegado. Ela se trocava no quarto quando ele entrou. Com o susto ela deixou cair a camisola, que tentava pôr com dificuldade, expondo seu corpo bastante emagrecido. Seios flácidos, costelas aparentes, palidez. Seu cabelo estava fino e sem brilho, uma grande ferida, bastante inflamada e úmida fazia uma clareira no lado esquerdo de sua cabeça e vinha até sua fronte, dando um aspecto horrível e monstruoso. Tinha os olhos fundos e olheiras negras, dentes amarelos, covas no lugar das bochechas. Assustada, falou, Jean, o que é isso? Sua voz saiu seca e rouca e começou a tossir. Ele apontou a arma para seu rosto outrora jovem e belo, mas não conseguia repetir o pequeno discurso que tão bem tinha preparado para aquela hora, tentou balbuciar alguma coisa, mas nada saia. Num segundo tinha os pensamentos todos embaralhados, sentia-se muito mal, uma dor insuportável no ventre, um frio glacial no peito, completamente vazio, sem chão, sem norte, sem rosto. Era menos que o nada, era o nada do nada. Caiu de joelhos, colou o cano da pistola na têmpora direita e disparou.
Não morreu, vive esquecido e doente, preso a uma cadeira de rodas num abrigo social. Guarda um sorriso discrteto no canto direito da boca. Dizem que é paralisia facial.

03 junho 2006

Senta que la vem a historia....

Tropecei em meus chinelos cor-de-rosa (eles não amam essa cor, preferiam ser azuis, mas simpatizam com o vermelho que quase são) essa manhã ao levantar. Machuquei de leve o esquerdo, sempre distraído, não pulou para o lado como o direito, sempre mais esperto. A direita é sempre mais esperta que a esquerda. Depois das desculpas, solicitei gentilmente (já estava sendo gentil, foi fácil continuar) aos meus comumelos mágicos (markadeerstrasse, 81) se podería comê-los, alguns, em meu petit déjeuner (eles falam francês, mas foram educados em "dutch"). Só sorriram... quem cala consente. O segundo foi mastigado cantando "Angie" dos Stones.
Agora sim, já enxergava melhor nessa manhã cinzenta. Abri a janela, como que por instinto, esquecendo que fazia frio, cerca de 0 graus, e que a neve da soleira poderia imediatamente tentar pular para dentro a procura de um canto mais aconchegante para morrer derretida, porém feliz. Isso não aconteceu... muita pretensão minha achar que a neve da soleira iria querer entrar na minha casa... o que minha casa tem de especial? Neve gosta é de frio!
Lavei o rosto, mas não me via no espelho. Via uma moça bonita, definitivamente não era eu, era melhor. Mas borrei sua leve maquiagem (um troço meio azul escuro em cima do olho) com água e sabão. Ela agradeceu e sumiu. Deveria estar cansada, ligeiramente perfumada, voltando de alguma aventura. E eu acordando...
Minha escova-de-dentes fez questão de escovar todos os dentes. Não ofereci resistência, cada um com seu trabalho. O fio dental deslizou indiferente, como um contador que faz o imposto de renda de uma velha viúva, ou como um guarda de trânsito em uma cidade do interior da Inglaterra. A solução fluorada de enxague bucal tinha gosto de molho indiano de iogurte, dessa vez exagerou. Sempre inventava novos sabores, gostava quando era canela, ou gianduja, mas curry com iogurte não ficou bom. Sentado na cadeira da escrivaninha achei completamente idiota um cuidado assim especial com os dentes, mas o mal já estava feito.
Dedilhei uns acordes que se assemelhavam ao ritmo indiano, para acompanhar o gosto de curry na boca, e então a camapainha tocou. Tocou de forma gentil, estávamos todos gentis naquela manhã. Do outro lado da porta percebi que havia um velho senhor e uma menina anã. Quando abri a porta e finalmente pude ver, com a luz púrpura que vinha de do apartamento ao lado, e compreendi que se tratava e uma jovem menina e um velho senhor anão. Diferente de todos nós, o senhor anão não era gentil e empurrou a menina para dentro de meu quarto, balbuciou algumas palavras com sua boca sem dentes, vestiu seu chapéu mágico (que ironicamente se parecia com uma cartola comum) e sumiu dentro dele. A menina sorriu pequenos dentinhos separados e me disse, sem falar palavra, que se chamava Brune e que estava ali pois achava aquele lugar muito legal (palavras, não pronunciadas, dela) e que todos ali eram muito gentis. Ofereci-lhe uma almofada e sentamos no chão. Seu cabelo castanho escuro e muito fino estava desordenado, vestia um vestido azul marinho e uma sandália de palha, a qual disse ter ganhado de um macaco no norte Tailândia quando visitava templos. Jogamos um pouco de dominó, mas nossas peças invisíveis nos impediam de saber quem ganhava. O que ela gostou mesmo foi de ver fotos de Köln e escutar um pouco das histórias que eu contava em baixo tom. Achava graça da minha forma primitiva de raciocínio e sempre repetia que eu era muito gentil. Comeu um cogumelo, que não se calou mesmo já dentro de seu estômago, sempre discutindo a fase amarela de Van Gogh. Pequenas asas, parecidas com asas de um libélula, foram surgindo de suas costas e subitamente ela voou iluminada pelo quarto, atravessou a parede dos fundos e foi embora agradecendo a gentileza.
Cocei a cabeça, flutuei até a escrivaninha, sentei com uma taça de chá bem quente ao meu lado, o quarto iluminado de verde escuro pelo sol, começei a escrever os fatos da manhã...